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segunda-feira, 31 de outubro de 2011

A DEMANDA DO SANCTO GRAAL NACIONAL - OBSCURA ERA TREVAL NA TRANSIÇÃO CONJUNTURAL - 5


A DEMANDA ACTUAL DO SANCTO GRAAL NACIONAL - OBSCURA ERA TREVAL NA TRANSIÇÃO CONJUNTURAL - 5

NEUZA MACHADO

Nos idos que lá se vão,
no Dezenove Final
da Moderna Convenção
de um viver Não-Social,
o Brasil, na contra-mão
do Progresso Maquinal,
vivia da Escravidão,
em retrospecto vital.

Foi então que apareceu
a Princesa Genial
e com u’a vera grandeza,
por certo!, meio anormal,
– pois o rico, com certeza!,
em seu viver especial,
não avalia a tristeza
de quem sofre o grande mal
de não ter comida à mesa
pra ter saúde normal –
a dicta cuja Princesa,
a Isabel Senhorial,
filha de Sua Alteza,
o Pedro Segundo Legal
oriundo da nobreza
provinda de Portugal,
em sua gran realeza,
com toda pompa real,
num gesto de gran justeza,
libertou o Espectral
da Escravidão-Malvadeza
no Dezenove Final.

Mas, o gesto cordial
da Princesa, no seguinte
século, muito imoral!,
o dicto século vinte
de um Milênio Anormal,
o Segundo, do Acinte
de Guerrona Universal,
só na História ficou,
distinguindo a Imperial:
e o Pobrim continuou
a viver Inferno Astral;
no Brasil, nada mudou
para o Pobre Espectral,
pois a escravidão se firmou,
quomodo fosse normal,
norma que o Rico impostou
no Cartório Principal
onde o Primeiro assinou,
as regras do Capital,
tomando de quem suou,
capinando vei-roçal,
tudo o que lhe restou
de dignidade e moral,
pagando a quem labutou
co’um ordenado banal.

No princípio sem ação
Do Vinte, sec’lo infernal
da Moderna Convenção
de um viver Não-Social,
o Brasil, na contra-mão
do Progresso Maquinal,
rectomou o diapasão
d’uma Era Mui Treval
– o mesmo Velho Padrão
de trabalho artesanal –,
em que Fazendeiro-Patrão
de Nova Era Abismal,
de Mestiça Geração,
mas, com poder anormal
pra continuar Sinhozão,
tinha Lavrador Braçal,
em cada Canto do Sertão
do Gran-Brasil, Gran-Terral,
onde impunha a Larga Mão
do Comandar Regional,
submetendo o Povão
e sua Prole Espectral
co’um soldo-escravidão
preso no Armazém Geral
(propriedade do Mandão,
o Sinhozão Principal),
o soldo da refeição
da necessidade vital
para a rala mastigação,
o arroz bichado e o sal,
um punhado de feijão
e o cafezim matinal,
e nada de tropicão
– nada de carne com sal
e manteiguinha com pão
na refeição trivial
do Pobrezinho Peão,
a trabalhar por jornal.

(Carne de porco-capão
de saborzim sem-igual,
só na mesa do Chefão,
o Escravocrata Letal,
o dicto cujo Senhorzão
da Escravidão Serviçal).

sábado, 29 de outubro de 2011

A DEMANDA DO SANCTO GRAAL NACIONAL - A CAMELOTE BRASILEIRA DO FINAL DO SÉCULO PASSADO - 4


A DEMANDA ACTUAL DO SANCTO GRAAL NACIONAL - A CAMELOTE BRASILEIRA DO FINAL DO SÉCULO PASSADO - 4

NEUZA MACHADO

Na Antiga Camelote
do meu País Sem-Igual,
de nome raro – Brasília,
do Brasil a Capital –,
muitos Jaians – em magote –
dominavam o Espectral
– sem comida, sem mobília –,
o Povinho Fantasmal,
a caminhar sempre em lote,
sem um destino final
que o tirasse da miséria
de um viver com pouco sal,
a trabalhar por rala féria
sem valor comercial,
que mal dava p’ra despesa
do despender semanal,

enquanto a Alta Realeza
manjava Manjar Real
– picadinho de nobreza,
de Cozinha Imperial,
filet-mignon, com certeza!,
para o Jaião Principal,
pois a Corte – à francesa –,
da bendita Capital,
no Vinte – da Gran Pobreza
do Brasileirinho Banal –,
nadava em luxo e esperteza,
sem ligar pro’Espectral
– o Tal da Vera Pobreza,
uma pobrez’anormal –,
em meio à Larga Riqueza
de um Gran Brasil Colossal.

Agora, um Excurso Legal
para entender os mosaicos
deste Cordel Neo-Graal:
Os paralogens arcaicos
exigem atenção total,
pois, levemente prosaicos,
neste “Lictígio Actual”,
à moda dos escritos laicos
da Era Medieval,
revelam o Gran Demando
de um Povo que, ao Final
de um Domínio mui nefando
de Língua Não-Nacional
– um linguajar estrangeiro,
altivo, Senhorial,
no Vinte, muito guerreiro!,
Séc’lo de Guerra Viral –,
a Portuguesa apagando
do Compêndio Brasileiro,
– o Linguajar do Comando
de proprietário encrenqueiro –,
a colonizar, comandando!,
a Mente do Sem-Dinheiro,
Colônia Mental actuando
no Escolar Sem-Roteiro.

Portanto, neste Eixecal
Rectomando o Tramareiro,
para um “Demandar Legal”
nas Aras do Mundo Inteiro
– a nossa Aldeia Global –,
a que narra resolveu
visitar o Vei-Glossário
de um Cantarzão de Museu
– as Musas do Dicionário
em Festival Himeneu
com um Vei-Vocabulário
pra’um Neo-Povão Altaneiro –,
rectomando o Original,
com a força do Verbo dado
por Navegador Cordial,
dinâmico, aventureiro,
provindo de Portugal,
um Linguajar Muito Amado
pelo Vero Brasileiro,
descendente, já provado
por DNA Verdadeiro,
de Pedro Álvares Cabral,
o “Chefe Enéias Primeiro”
da “Brasileida” Imortal
do Português Pioneiro.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

A DEMANDA ACTUAL DO SANCTO GRAAL NACIONAL - 3


A DEMANDA ACTUAL DO SANCTO GRAAL NACIONAL - 3

NEUZA MACHADO

Nesta “Demanda Actual”,
do Terceiro – Vinte e Um –,
do “Sancto Graal Nacional”,
– Futura Copa Incomum –,
a que narra, cantará,
com engenho e muit’ação,
a vidinha ao deus-dará
da pobre população
de um País Abençoado
com fartura em profusão,
mas que em Passado Atrasado
– não esquecido, isto não! –,
em que um Povo Assinalado,
pra ter fartura em montão,
vivia desmotivado,
com doença e sem ação,
vivendo vida incruenta
– o meu Brasileiro-Povão –,

pois, ao final dos noventa,
do Vinte Sem-Condução,
ficava com o bolso vazado,
a trabalhar por tostão,
comendo o pão amassado,
com o Rabo do Tinhão,
feito com trigo mofado,
replecto de podridão.

E quando não tinha nada
no fogão do meu Povão
pra nutrir a criançada
com boa sustentação,
a família azarada,
sem nenhuma condição,
sem empreguinho, sem nada,
em magoada arribação,
saía pela Cidade
com o pratinho na mão,
implorando caridade
pra os que tinham coração.

Quando o Terceiro chegou,
o Século da Salvação,
a vida do pobre mudou,
graças à Nova Eleição,
– uma Eleição!, com efeito! –,
e o Brasil então ganhou
vida nova, gran respeito,
muita consideração
por parte do Mundo Veiro
que perdia seu Milhão,
pois enquanto o Estrangeiro
guiava na Contra-Mão
o seu progresso financeiro,
perdendo a direção
de como ganhar dinheiro,
sem cuidar do seu povão,
o nosso Gran Brasileiro,
o Luís, revelação
de um Guia Bom-Timoneiro
para a Brasileira-Nação,
com a força de quem sofreu
no Passado privação,
a Gran Tormenta venceu,
sacudiu a inação
que fazia o Brasileiro
aceitar a escravidão,
submisso ao Estrangeiro
que era o Grande Patrão.

E tudo aqui melhorou!
Com a Moral mais elevada,
o Brasileiro ganhou
a nutrição desejada
– aquele muito pobrinho
que saía pela estrada
com a Família em desalinho
pedindo boa pousada,
muita bondade e empreguinho,
à Elite Endinheirada.

Mas a “Demanda Actual”
não pode agora parar,
a “Demanda Nacional”
precisa muito lutar,
ainda há pobres sofrendo,
a viver ao deus-dará,
muitas pessoas morrendo
sem o Nutritivo Maná.

E o rico, aqui da Parada
(as Revistas e os Jornais),
a reclamar, de lufada!,
como nunca se viu!, jamais!,
da Bolsa-Família dada
ao brasileirinho sem-eira,
um dinheirinho de nada,
que muito ajuda na Feira,
uma Bolsa abençoada,
uma ajuda hospitaleira,
uma bem-vinda guinada
em nossa Rota Brasileira,
que custa menos que os “Quilates”
doados, pelo Rico Milhardeiro,
aos “Uisqueiros” das Boates
das Cidades do Estrangeiro.

sábado, 22 de outubro de 2011

A DEMANDA ACTUAL DO SANCTO GRAAL - O SIGNIFICADO DA PALAVRA "ACTUAL" - 2


A DEMANDA ACTUAL DO SANCTO GRAAL – O SIGNIFICADO DA PALAVRA “ACTUAL” - 2

NEUZA MACHADO

O “actual” desta “Demanda”,
à moda Colonial,
foge à regra que comanda
a nossa Norma Atual,
que retira o que excede
de um narrar dicto normal,
pois todo falar procede
de seu meio social.

E o falar do brasileiro,
neste Terceiro Global,
é um falar milongueiro,
diferente, musical,
o linguaragem de acá,
– o meu falar nacional –
não é o mesmo de lá,
o português de Portugal.

Mas, a minha Neo-“Demanda”,
requer um Diferencial,
pois é uma Causa-Ciranda
neste meu Brasil Actual,
“demanda” de pobre desanda
em Revista e em Jornal,
a Imprensa não dá “Anda”
para o Pobre Espectral.

E se for um Neo-Narrado,
e não intrigar o Leitor,
não será valorizado
por Analista-Doctor,
quem “demanda” para pobre,
costuma perder o valor,
lutar contra gente esnobe,
“demanda” muito suor.

Que o diga o nosso Nobre
Presidente Não-Doutor,
Por mais que ele se desdobre
Para fazer o melhor,
Distinguindo o rico e o pobre
Deste Brasil Multi-Cor,
com palavra de mor-dobre,
nos “Pleitos” do Exterior,
a Imprensa daqui encobre
o seu devido valor.

Por isto, esta “Demanda”,
“demanda” um diferencial,
por meio de Veneranda
formatação sem-igual,
“demandando” vei-linguagem
de um passado imortal,
provinda da Grã Viagem
de Pedro Álvares Cabral.

Esta minha Neo-Varanda
pretensamente Original,
esta vera Neo-“Demanda”
do “Actual” de meu Jogral,
luta por quem não tem “Anda”
para uma “Demanda” Legal.

Aqui, ainda há Pobres sem lar,
e há Muuuitos no Exterior,
e são poucos a lutar
para tirá-los do horror,
é preciso “trovejar”
– o Cônscio Neo-Trovador –,
é preciso “demandar”
para quem aspira a ter valor
e não tem voz de troar
em Távola de Imperador.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

21 DE OUTUBRO DE 2001 - EPÍSTOLA AOS HOMENS DO FUTURO - 5


Esta minha Epístola aos Homens do Futuro foi escrita em:

21 DE OUTUBRO DE 2001 - EPÍSTOLA AOS HOMENS DO FUTURO - 5

NEUZA MACHADO

Meus Caros Amigos do Maravilhoso Futuro Brasileiro Sem-Muro, neste Anno de 2001, mais precisamente neste dia 21 do mês de outubro de 2001, a coisa aqui tá preta, ou melhor, está branca. Surgiu no Mundo Global, junto com esta Guerra Inglória que nos perturba, a chamada Guerra Bacteriológica. Apareceu, por aqui, um pó branco assustador repleto de bactérias mortais. Esse pó provoca uma doença chamada Antraz. A Humanidade Sem-Rumo atualmente (neste anno de 2001) ― espero que acreditem em mim! ― está apavorada. Esta praga não se compara com as outras pragas já registradas na História do Mundo Rotundo. É algo terrível e inexplicável. A poeirinha da morte chega ao destinatário pelo Correio, dentro de carta lacrada, contaminando quem a manusear. Justo agora, no momento desta Guerra Ingloriosa de 2001, aparece a tal doença. Não sei explicar-lhes o nosso pavor. Falando por mim, só posso dizer-lhes que a minha angústia é imensa. Espero confiante a proteção de um Herói, um cavaleiro audaz, surgindo do Nada, trazendo nas mãos o antídoto salvador. Entretanto, Amigos do Futuro Brasileiro Sem-Muro!, penso que, atualmente (anno de 2001, não s’esqueçam!), não há Herói que dê jeito em toda esta confusão. E, por falar em Herói, não há mais Heróis neste meu Mundo Globalizado. Os Heróis ficaram lá no Passado Endeusado. Os heróis de hoje já morreram ou estão morrendo aos montes ingloriamente. De qualquer maneira, eu sei que ― todos nós sabemos ― um Herói Sem-Igual chegará, muito em breve!, para nos salvar de um futuro horrendo. Será um Herói para o Brasilês Futuro Sem-Muro!

Ao contrário dos Homens Antigos, que cultuavam os Heróis do Passado, nós, do Século XX e Início do Século XXI (anno de 2001, não s’esqueçam!), vivenciamos uma situação singular: os Heróis que cultuamos neste anno de 2001 estão no Porvir (aí no exato momento do Presente de Vocês!). Nós, os Brasileses Descontrolados do Passado Século XX, sabemos direitinho como são Vocês, os Brasileses do Futuro Sonhado; imaginamos as vestimentas que usam, os veículos futuristas que transitam por suas ruas douradas, visualizamos suas cidades bem planejadas, admiramos a forma como vocês se livram das doenças indesejáveis, et cœtera, etc. O Futuro Sem-Muro do Brasil Cor de Anil, de acordo com a nossa percepção sonhadora, neste anno de 2001, se movimenta na mais perfeita Ordem. Eu, por exemplo, tenho certeza de que, neste exato momento deste meu Presente Histórico!, já está nascendo o Herói da Humanidade. Uma Super-Criança está nascendo em alguma Maternidade do Mundo Rotundo (quiçá do Brasil Varonil), e com certeza estará destinada a realizar a maior façanha de todos os tempos: transformar o Planeta Terra em um lugar onde se possa viver em paz. Pesquisem aí no Futuro-Sem-Muro e descobrirão. A criança, do sexo masculino naturalmente ― ainda cultuamos o patriarcalismo neste anno de 2001 ―, está nascendo, agora, neste instante. Gostaria, imensamente, que ela fosse brasilesa. Neste exato momento, o Herói está nascendo. Confiram aí no Futuro Sem-Muro: são uma hora, trinta e três minutos e zero segundo, do dia 21 de Outubro de 2001, Horário de Verão no Brasil Varonil.

Se vocês quiserem compreender o que quer dizer Horário de Verão, saibam que, de vez em quando, até este mês de Outubro de 2001, o governo brasilês atual ― o FHC ― manda o povo adiantar os relógios em uma hora. Assim, se os cálculos do horário acusarem zero hora (meia-noite), trinta e três minutos e zero segundo, saibam que ambos ― os dois horários ― significarão a mesma coisa. É um pouco complicado, mas, com boa vontade, Vocês do Futuro Sem-Muro compreenderão. Só para melhorar um pouco mais a minha explicação, informo-lhes que há uma razão para esta atitude do atual Governo, o Fernando Henrique: o Horário de Verão Econômico ajuda-nos a economizar luz elétrica e, assim, os recursos financeiros, dos quais o País carece, aumentam. Fazemos economia, porque queremos saldar nossa imensa e incontrolável dívida com o FMI. Infelizmente, a tal dívida parece não ter fim (será que esta tal dívida já estará definitivamente quitada aí no Futuro?).

Desculpem-me, mas em uma outra carta explicarei o significado desta sigla FMI. Hoje não. Estou um pouco cansada do trabalho semanal estafante. Na próxima semana, espero enviar-lhes uma carta mais esclarecedora. Esta de hoje está meio embaralhada. As notícias da Ágora Global, neste 21 de Outubro de 2001, não s’esqueçam da data!, não são muitas boas, por causa das duas Guerras que apavoram o Mundo Rotundo. Duas Guerras ao mesmo tempo. Vocês dirão, quando lerem esta minha cartinha: Pobres Mortais Globais do Anno 2001! Mas, o Herói está nascendo, neste exato momento (21 de Outubro de 2001), em uma grande Maternidade do Mundo (quiçá do Brasil Varonil!). Seu nome se perpetuará como símbolo de uma Nova Era de paz.

Meus Amigos do Brasilês Futuro Sem-Muro, que a Paz e o Amor reinem em seus lares!

Por ora, terminando o meu missivo (não confundam com míssil, por favor), quero dizer-lhes que o Rio de Janeiro, neste anno de 2001 (apesar do desamor de seus governantes), continua bello como sempre. O Sol Hipercariocjônio ilumina a Cidade Maravilhosa dos Cariocas Intrépidos (aqueles que não trepidam nunca, já que são corajosos e não vacilam ante os obstáculos de um Destino adverso!). Por esta razão, peço-lhes licença para plagiar Horácio (Carmen Saeculare ― Roma Antiga, época de Augusto): O’ Sol capaz de produzir a abundância, que faz existir o dia com (seu) carro hiper-iluminado e o oculta, e nasce sempre diferente e sempre igual, tomara nada possa contemplar (nos séculos vindouros) maior que a Cidade do Rio de Janeiro.

No próximo Domingo (no dia 28 de Outubro de 2001) enviar-lhes-ei outras notícias. Aguardem-me!

Recebam o meu Grande Amor Transtemporal.

ODISSÉIA MARIA, filha de Antônio Aquileu e Jane Briseides, descendentes de notáveis Caçadores de Onças Pintadas e Jaguatiricas Noturnas de Minas Gerais, uma Incrível Região localizada na Parte Leste do Brasil Varonil.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

CECÍLIA MEIRELES E SEU "ROMANCEIRO" PÓS-MODERNO: ROMANCE XXXI OU DE MAIS TROPEIROS


CECÍLIA MEIRELES E SEU “ROMANCEIRO” PÓS-MODERNO: ROMANCE XXXI OU DE MAIS TROPEIROS

NEUZA MACHADO

Hoje, neste meu blog, o canto escolhido para ser apresentado aos Leitores-Internautas (que sempre me honram com suas visitas) tenciona homenagear os muitos corajosos brasileiros que, assim como Tiradentes (que era um simples Alferes de Cavalaria no final do século XVIII), se empenharam patrioticamente pelo bem-estar socioeconômico da maior parte de nosso povo (aquela maior parte em situação de extrema miséria).

Sempre será válido lembrar, com as mais vivas cores, que, até bem pouco tempo (até ao final do século XX), o Brasil estava comprometido com o FMI, por causa de uma dívida que parecia não ter fim. E que, por orientação expressa desse organismo financeiro, assumia posturas que sobrecarregavam todos os brasileiros com altas taxas e impostos.

Dentro desse contexto de vampirismo feito pelos anteriores submissos governantes de um tenebroso passado, os que mais sofriam eram a classe média (a que realmente pagava os impostos exigidos), uma classe que, sem ter dinheiro suficiente, tentava manter uma aparência de riqueza, e a classe proletária, que não tinha reserva alguma de capital para prevenir-se das oscilações financeiras. Os poucos muito ricos (com seus secretos cofres e com suas contas protegidas em paraísos fiscais), no máximo, diminuíram o número de viagens, mas, apenas, para não ficarem expostos às manchetes. Quanto aos pobrezinhos brasileirinhos do século XX (aqueles submetidos à miséria extrema, passando fome intensa), será que eles sabiam do quê e por quê estavam morrendo?

Para mudar esse quadro no Brasil, somente os historicamente incomodados e resistentes homens do povo, aqueles capazes de tirar leite da pedra, repletos de fé inabalável no futuro (os que lutaram por uma Nação dignificada, hoje, todos bem representados pelo líder sindicalista dos metalúrgicos dos anos oitenta, Luís Inácio Lula da Silva), tiveram a coragem de encarar de baixo para cima o olhar superior do ciclope FMI.

Será que os 80% do povo brasileiro, os que agora reabilitaram suas dignidades, que não precisam mais olhar o porvir com os olhos desesperançosos, irão desistir da busca pela emancipação financeira e se conformarão com o que já foi conquistado?

Sempre consciente de que a arte literária – produzida em qualquer ocasião da história da humanidade – possui força moral para que seus leitores do momento e os do futuro possam refletir sobre os problemas que os incomodam, exponho aqui, neste meu sítio, essa expressiva visão lírica de Cecília Meireles, a respeito da história dos inconfidentes do Brasil-Colônia. Inclusive, reafirmando sempre que a matéria lírica, neste Romanceiro de Cecília Meireles, foi singularmente conformada em uma grande obra epo-lírica (narrativa em versos, apresentando os fenômenos estilísticos próprios do Gênero Épico).


ROMANCE XXXI OU DE MAIS TROPEIROS

Cecília Meireles

Por aqui passava um homem
– e como o povo se ria! –
que reformava este mundo
de cima de montaria.

Tinha um machinho rosilho.
Tinha um machinho castanho.
Dizia: “Não se conhece
país tamanho!”

“Do Caeté a Vila Rica,
tudo ouro e cobre!
O que é nosso vão levando...
E o povo aqui sempre pobre!”

Por aqui passava um homem
– e como o povo se ria! –
que não passava de Alferes
de cavalaria.

“Quando eu voltar – afirmava –
outro haverá que comande.
Tudo isto vai levar volta,
E eu serei grande!”

“Faremos a mesma coisa
que fez a América Inglesa!”
e bradava: “Há de ser nossa
tanta riqueza!”

por aqui passava um homem
– e como o povo se ria –
“Liberdade ainda que tarde”
nos prometia.

E cavalgava o machinho.
E a marcha era tão segura
que uns diziam: “Que coragem!”
E outros: “Que loucura!”

Lá se foi por esses montes,
o homem de olhos espantados,
a derramar esperanças
por todos os lados.

Por aqui passava um homem...
– e como o povo se ria!...
Ele, na frente, falava,
e, atrás, a sorte corria...

Dizem que agora foi preso,
não se sabe onde.
(Por umas cartas entregues
ao Vice-Rei e ao Visconde.)

Pois parecia loucura,
mas era mesmo verdade.
Quem pode ser verdadeiro,
sem que desagrade?

Por aqui passava um homem...
– e como o povo se ria! –
No entanto, à sua passagem,
tudo era como alegria.

Mas ninguém mais se está rindo,
pois talvez ainda aconteça
que ele por aqui não volte,
ou que volte sem cabeça...

(Pobre daquele que sonha
fazer bem – grande ousadia –
quando não passa de Alferes
de Cavalaria!)

Por aqui passava um homem
– e o povo todo se ria.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

A DEMANDA ACTUAL DO SANCTO GRAAL - O SIGNIFICADO DA PALAVRA "DEMANDA" - 1


A DEMANDA ACTUAL DO SANCTO GRAAL – O SIGNIFICADO DA PALAVRA “DEMANDA” - 1

NEUZA MACHADO

“Demanda” quer dizer “processo”,
pode ser “causa” ou “questão”,
“litígio” (contra quem é avesso
aos “desmandos” sem-razão).

“Demanda” quer dizer “pleito”,
pode ser muita “intenção”
de prejudicar o Grã-Sujeito
que só quer o bem da Nação.

Toda “demanda” tem preço,
pois é um “serviço” a prestar,
“demanda” de rico é um excesso
de dinheiro a ré-contar.

Se toda “demanda” tem preço
pois é um “serviço” a prestar,
“demanda” de pobre é um excesso
de contas sem-conta a pagar.

A “demanda” do pobre é um Calvário
Muuuito Antigo!, em meu Lugar,
uns poucos com altos salários
querendo ao pobre explorar.

Togado exigindo mais soldo,
a esvoaçar seu Talar de Marajá,
pago por quem não tem toldo
e vai vivendo ao deus-dará.

A “demanda” do rico é de um jeito
que não dá para explicar:
Pense num grande eito
com “grana” a multiplicar,

o rico, com grande efeito,
o seu feudo a comandar,
e o “pobrezinho sujeito”,
na soleira a trabalhar,

sem ter sequer o direito
de “demanda” a reclamar,
com muita dor em seu peito
e um salariozinho de amargar.

“Demanda” agora é lutar
por justiça social,
que permita equilibrar
a riqueza nacional,

diminuindo a realeza
do rico, e seu embornal,
sua bolsa de riqueza
de tamanho colossal.

Riqueza adquirida
com o trabalho do Povão.
A grã-pobreza sem vida,
sem comida, sem tostão.

E o rico, aqui da Parada
(as Revistas e os Jornais),
a reclamar, de lufada!,
como nunca se viu!, jamais!,

da Bolsa-Família dada
ao brasileirinho sem-eira,
um dinheirinho de nada,
que muito ajuda na Feira,

uma Bolsa abençoada,
uma ajuda hospitaleira,
uma bem-vinda guinada
em nossa Rota Brasileira.

Que custa menos que os “Quilates”
doados, pelo Rico Milhardeiro,
aos “Uisqueiros” das Boates
das Cidades do Estrangeiro.

Os ricos, todos, ganhando
Dinheirão-Jabaculeiro,
e, ainda, reclamando
da “Bolsa” do Sem-Dinheiro!

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

A HERANÇA (POLÍTICA) DO "ONTEM ETERNO" OU A DESTRONIZAÇÃO DO PODER


A HERANÇA (POLÍTICA) DO "ONTEM ETERNO" OU A DESTRONIZAÇÃO DO PODER

NEUZA MACHADO

Nesses dias de infindáveis altercações políticas aqui no Brasil, em que a rica minoria elitista oriunda dos herdeiros da Casa Grande não aceita a idéia de que um operário metalúrgico – que para a infelicidade desta minoria se tornou o Grande Presidente Reformador da Nação – possa ser aclamado e reverenciado no exterior, lembrei-me de um capítulo de minha Dissertação de Mestrado, que muito tem a ver com as ocorrências políticas atuais.

Esta minha Dissertação de Mestrado, sobre a narrativa A Hora e Vez de Augusto Matraga, de Guimarães Rosa, foi escrita no final da década de oitenta, e defendida em março de 1990 na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Hoje, relendo-a, percebo com mais acuidade o poder de raciocínio de nosso incomparável ficcionista sertanejo, no sentido de prever acontecimentos políticos que só seriam efetivados muitos anos depois, nos anos iniciais do Terceiro Milênio.

Peço aos meus leitores que leiam este capítulo, e depois me avisem se algumas semelhanças dos personagens com alguns ricos políticos opositores do atual Governo agora Popular poderão ser conceituadas como simples coincidências. Leiam também o conto de Guimarães Rosa (leitura de suma importância para uma produtiva comparação extratexto). A narrativa de Guimarães Rosa, A Hora e Vez de Augusto Matraga, faz parte da Coletânea de contos do livro Sagarana). Vale a pena ler e repensar a “queda” sócio-política do imperioso Nhô Augusto do passado, Senhor das Pindaíbas e do Saco-da-Embira, e de seus ricos descendentes que ainda teimam em se vestir de poderosos, entretanto, no íntimo, bem no íntimo, todos inconformados com a perda do poder do “ontem eterno” e do nome.


A HERANÇA DO ONTEM ETERNO OU A DESTRONIZAÇÃO DO PODER

Neuza Machado

Continuando a repensar a questão da “autoridade do ontem eterno”, na narrativa ficcional A Hora e Vez de Augusto Matraga de Guimarães Rosa ― e apropriando-me de algumas assertivas de Max Weber ―, posso inferir que Nhô Augusto herdou um pequeno Império (representação do “ontem eterno”) e, durante algum tempo, nele reinou. Enquanto existiu a sua autoridade política, foi o personagem a representação do poder. Observo isto pela sua atitude superior ao arrematar, no leilão ("de atrás da Igreja"), a Sariema, aquela que era muito amada pelo capiauzinho “enamorado”, capanga do major Consilva.

O povo (ainda submisso às leis patriarcais) evidentemente aplaudiu e glorificou a atitude do Poderoso Nhô Augusto.

O poder e prestígio do personagem, até ali, continuavam inalterados. Mas, havia um outro personagem ambicionando sua posição privilegiada e procurando as brechas para derrubá-lo: o major Consilva, “velho” inimigo da família Esteves.

Recorde o Leitor a resposta de Nhô Augusto, quando o Quim Recadeiro (o Mensageiro dos poderosos) retornou dizendo que o major havia “comprado” os bate-paus: “Major de borra! Só de pique, porque era inimigo do meu pai” (A Hora e Vez de Augusto Matraga)

O major procurou e encontrou um meio de desmoralizá-lo. Sinal de que o dito poder do “ontem eterno” não estava bem edificado e ameaçava ruir: bebidas, mulheres, pancadarias, jogos, dívidas; tudo isto proporcionava a sua decadência.

O poder social do personagem se encontrava ameaçado por um inimigo mais perigoso que o major Consilva: o contra-poder econômico da decadência do sertão. Ora, se aquele Senhor poderoso e, principalmente, chefe comunitário respeitado estava prestes a perder tudo o que possuía (família, terras), era natural que outro reivindicasse sua glória e prestígio.

O narrador roseano em princípio impõe-se e impõe-nos visualizar a figura imponente de Nhô Augusto, mas logo depois do leilão ("de atrás da Igreja") mostra que ele está a poucos passos da decadência.

As sucessivas transformações narrativas, ao longo da análise esclarecedora, são significantes dos vários estágios de vida estacionados no espaço do sertão mineiro-brasileiro, sobrepondo-se infinitamente, imunes à ação do tempo.

O narrador ficcional do século XX conseguiu apreender essas sutilezas, subjacentes em um espaço onde as Idades do Mundo se confundem e se completam. O narrador interativo do século XX apreendeu as várias etapas do tempo, entrelaçando-se e rejeitando-se, mas prestes a se anularem, graças à fragmentação do mundo moderno. Etapas de tempo que se sobrepuseram, se eternizaram e se eternizarão, enquanto houver um relator que as conte por intermédio da memória ― ou através da recordação ― e um ouvinte que compactue com seu ato de narrar.

A "queda" do personagem Nhô Augusto e suas etapas de vida representam as transformações de uma determinada burguesia que se acomodou nos pequenos vilarejos do sertão de Minas Gerais, desde os anos finais do século XVIII. Sabemos hoje que já não há Senhores-de-terra poderosos, mas as grandes famílias que comandavam politicamente essas localidades ainda permanecem dominando (ou insistem em permanecer dominando), engajadas em partidos políticos conservadores e alardeando suas origens. Os atos de heroísmo ou covardia infelizmente são fatos do passado e quase não há narradores para relembrá-los.

Por este prisma confirmo que, nesta narrativa especialmente, o narrador de Guimarães Rosa apresenta o momento de crise vivido por seu personagem Nhô Augusto, um “herdeiro do ontem eterno” brasileiro, em acordo com a crise sócio-econômica que ocorreu no Brasil do século passado, principalmente na sociedade agrária sertaneja a partir dos anos trinta do século XX. O inevitável impasse, as mudanças existenciais do personagem e a própria transformação discursiva do narrador roseano representaram e representam, inclusive, a mudança de poder político que ocorreu no Brasil, com a ascensão daqueles que antes eram considerados subalternos; ainda: o contra-poder (representado pelo povão desvalido) se transformando em poder de fato.

“Quando chega o dia da casa cair — que, com ou sem terremoto, é um dia de chegada infalível — o dono pode estar: de dentro, ou de fora. É melhor de fora! E é a só coisa que um qualquer-um está no poder de fazer. Mesmo estando de dentro, mais vale todo vestido e perto da rua. Mas, Nhô Augusto, não: estava deitado na cama — o pior lugar que há, para se receber uma surpresa má” (conferir a citação em A Hora e Vez de Augusto Matraga)

O major Consilva (ainda um personagem representativo do poder patriarcal), personificação do contra-poder que aspira ao poder, em A Hora e Vez de Augusto Matraga, narrativa ficcional escrita por Guimarães Rosa em meados do século XX, “conquista”, por meio de pagamento em dinheiro, os capangas escravizados de Nhô Augusto (aqueles que não conheciam sequer a cor do dinheiro e muito menos o que queria dizer a palavra “salário”). O poder do herói sertanejo pré-capitalista do século XX, enquanto um herdeiro do “ontem eterno”, ruíra.

“Quando chega o dia da casa cair — que, com ou sem terremoto, é um dia de chegada infalível — o dono pode estar: de dentro, ou de fora. É melhor de fora! E é a só coisa que um qualquer-um está no poder de fazer. Mesmo estando de dentro, mais vale todo vestido e perto da rua. Mas, Nhô Augusto, não: estava deitado na cama — o pior lugar que há, para se receber uma surpresa má” (Guimarães Rosa, A Hora e Vez de Augusto Matraga)

Reavaliando o que foi afirmado anteriormente (sobre a narrativa ficcional A Hora e Vez de Augusto Matraga, de autoria do escritor mineiro Guimarães Rosa):

Teríamos, neste trecho, a imagem de um momento de transição do Brasil? No espaço sócio-substancial do sertão de Minas Gerais várias etapas do Brasil Agrário se sobrepõem alheias à ação do tempo. Este trecho, significante de mudança narrativa, representa os “valores de uso” (a submissão primitiva do povo a um Senhor-de-terra) estando em vias de sofrer uma profunda transformação; ao mesmo tempo, representa os “valores de troca” mediatizados pelo dinheiro, valores estes que comandam o mundo burguês.

É interessante observar os motivos da debandada dos “bate-paus”. Se enquanto possuiu recursos e meios para ser um homem poderoso Nhô Augusto mandava e desmandava em seus subordinados (a arraia-miúda do Brasil do século XX), agora que se encontrava pobre não necessitava mais ser obedecido. Um outro poder — contra-poder (atenção: ainda um contra-poder vinculado a valores patriarcais) — estava a caminho e os “bate-paus” aceitaram mudar de comando.

Aqui entra um problema sério: o das classes sociais.

Na definição de Weber, hoje considerada reacionária (mas que diz a verdade sobre o ficcional), as classes sociais

“(...) não são comunidades; representam simplesmente bases possíveis, e frequentes, de ação comunal. Podemos falar de uma classe quando: 1) certo número de pessoas tem em comum um componente causal específico em suas oportunidades de vida, e na medida em que 2) esse componente é representado exclusivamente pelos interesses econômicos da posse de bens e oportunidades de renda, e 3) é representado sob as condições de mercado de produto ou mercado de trabalho” (Max Weber).

Quando Nhô Augusto mandou o Quim Recadeiro (o Mensageiro) chamar os “bate-paus” (seus subordinados), ainda não sabia que o major Consilva os “comprara” com uma melhor oferta de pagamento. Esquecera-se que andava mal de vida e que há muito tempo já não pagava o ordenado de seus homens de confiança. A obediência perde o sentido quando o homem perde o poder.

Vejamos o trecho:

“Dali a pouco, porém, tornava o Quim, com nova desolação: os bate-paus não vinham... Não queriam ficar mais com Nhô Augusto... O major Consilva tinha ajustado, um e mais um, os quatro, para seus capangas, pagando bem. Não vinham mesmo. O mais merecido, o cabeça, até mandara dizer, faltando ao respeito:

— Fala com Nhô Augusto que sol de cima é dinheiro!... pra ele pagar o que está nos devendo... E é mandar por portador calado, que nós não podemos escutar prosa de outro, que seu major disse que não quer” (A Hora e Vez de Augusto Matraga).

Eis aqui a inevitável “dinâmica do poder” com suas competições e pretensões assinaladas por Max Weber e já mencionadas anteriormente.

Para o narrador roseano de meados do século XX o major Consilva (é importante não confundir o poder do major com o poder provindo do próprio povo; ainda um major Consilva como personagem representante de uma outra face permanente do poder patriarcal) representa a certeza de que o sertão, enquanto espaço exterior aos conflitos do mundo, com suas superposições sociais e temporais ímpares, permanecerá intocável resistindo às investidas degradantes da sociedade moderna. Enquanto esse espaço exterior for captado por um olhar solitário e reconhecido como espaço sócio-substancial onde se ancora a tradição de um povo, este mesmo narrador sertanejo do século XX terá a certeza de que seu mundo de origem não se extinguiu. Apenas, em termos de narrativa ficcional, esse espaço ficará para trás, encubado como certas plantas que “dormem” sob a terra, retornando à vida de tempos em tempos.

As etapas de vida do personagem Nhô Augusto (um ex-poderoso), as etapas de discurso-vida do narrador, as etapas do mundo burguês sertanejo em aceleradas transformações necessitam ser significadas. Todos os envolvidos na narrativa (inclusive o major Consilva e o próprio narrador), não apenas Nhô Augusto, sentem o momento da perda de poder, percebem o momento da perda de valores arraigados, pressentem as mudanças existenciais.

O significante nuclear desse momento no âmbito da ficção é a “surra” aplicada no personagem. Nhô Augusto apanhou e todos apanharam: o narrador, a sociedade burguesa sertaneja, o leitor, que também compactuou e se apoderou da matéria do narrador e do infortúnio do personagem como se fosse sua desgraça que estivesse sendo narrada. Assim, um Nhô Augusto da estória de Guimarães Rosa como um personagem sem dúvida representante da burguesia; um narrador burguês do século XX; um leitor burguês do século XX; todos sentindo a vingança do mais fraco (dos bate-paus que bateram para valer), o mais fraco daquele histórico momento de meados do século XX; uma vingança aquela temporária, pois foi mediatizada por outro poder político (o poder do Major Consilva, um poder secular ainda patriarcal), para desforrarar-se de quem o ofendeu.

Nhô Augusto apanhou de seus próprios “bate-paus” de confiança, assessorados pelo capiauzinho apaixonado de Sariema (estão lembrados dele?, do capiauzinho de testa curta empregado do major Consilva?). Nhô Augusto foi marcado como rês; não teve tempo de se vingar do abandono da Dionóra. Nhô Augusto fora à chácara do major confiando em seu anterior poder de mando e se esquecera que esse poder residia exatamente naqueles quatro “bate-paus” desmerecidos por ele, os quais agora obedeciam ao major Consilva (seu rico inimigo, só para ver quem pode mais). Entretanto (os dois poderosos ainda não sabiam), era a hora do início, do princípio da vingança do povo mais fraco.

Assim, hoje, se encontra o rico herdeiro sertanejo “sem-terra” política (sem o antigo poder de mando imediato), descendente por via histórica de algum grande senhor do sertão brasileiro. Sabe-se vinculado pelo nome ― que traz como uma marca ― a uma dinastia de desbravadores de terra (com nomes ilustres), mas se pergunta por que estas “terras” políticas (o poder de mando imediato) já não são suas? Estas “terras” (as novidades que transformam) agora pertencem a famílias que outrora foram subordinadas de seus antepassados (e que se fazem conhecer por novos apelidos). Algum “Nhô Augusto Matraga”, por certo muito imprudente, perdeu-as (bebendo, jogando, trapaceando, impondo-se deslealmente, ridicularizando os seus próprios bate-paus).

MACHADO, Neuza. O Narrador Toma a Vez: Sobre A Hora e Vez de Augusto Matraga de Guimarães Rosa. Rio de Janeiro: NMachado, 2006 – ISBN 85-904306-2-6.


quarta-feira, 12 de outubro de 2011

CECÍLIA MEIRELES E SEU "ROMANCEIRO" PÓS-MODERNO: ROMANCE LXXXI OU DOS ILUSTRES ASSASSINOS


CECÍLIA MEIRELES E SEU “ROMANCEIRO” PÓS-MODERNO: ROMANCE LXXXI OU DOS ILUSTRES ASSASSINOS

NEUZA MACHADO

Nossos olhos críticos fazem, agora, o julgamento dos assassinos dos inconfidentes, cumprindo o vaticínio da poetisa “e, sobre vós, de longe, abrem grandes olhos pensativos”. Para esse julgamento, para abrirmos nossos “grandes olhos pensativos”, não nos bastará conhecer a versão oficial da história daqueles anos do final do século XVIII, será necessário interagirmos reflexivamente com o contexto que impulsionou as ações dos personagens históricos, literariamente revividos pela força anímica das imagens poéticas. Lendo o Romanceiro da Inconfidência, mas conscientemente respaldados por nosso imaginário-em-aberto, somos transportados àquele instante, para ajuizadamente fazermos nossa própria avaliação transtemporal.

E a reflexão histórico-poética projetada pelo Romanceiro de Cecília Meireles servirá para aprofundar o entendimento sobre o que ocorre hoje no Brasil, no que diz respeito à ascensão sócio-econômica da maioria de sua população anteriormente considerada de baixíssimo nível social, uma população que até há pouco tempo se encontrava em situação de extrema pobreza. Infelizmente, a idéia de repartir o pão fraternalmente, neste nosso país tão vasto e tão repleto de riquezas naturais, é algo que gera descontentamento nas classes ditas abastadas. As riquezas de nosso solo ainda são disputadas pela minoria mais endinheirada de nossa sociedade. De qualquer maneira, para a minha satisfação e gáudio, essa minoria pode até ser mais rica do que a de outrora, mas, graças aos Céus!, não é mais tão poderosa como antes. O poder inquestionável do passado existia porque o povo não conhecia a sua própria força para mudar os rumos da história. A atual perspectiva sócio-econômica instaurada pelo Presidente Metalúrgico possibilitou uma nova identidade para o povo, uma identidade coesa e consciente, capaz de agir para o bem da COMUM-UNIDADE.

Aos internautas conscientes, peço que leiam o ROMANCE LXXXI OU DOS ILUSTRES ASSASSINOS, da autoria de nossa grande poetisa Cecília Meireles, para que julguem com seus próprios meios interpretativos a sanha dos assassinos dos inconfidentes, e para que façam uma comparação criteriosa entre o momento passado e o momento presente.


ROMANCE LXXXI OU DOS ILUSTRES ASSASSINOS

Cecília Meireles

Ó grandes oportunistas,
sobre o papel debruçados,
que calculais mundo e vida
em contos, doblas, cruzados,
que traçais vastas rubricas
e sinais entrelaçados,
com altas penas esguias
embebidas em pecados!

Ó personagens solenes
que arrastais os apelidos
como pavões auriverdes
seus rutilantes vestidos,
– todo esse poder que tendes
confunde os vossos sentidos:
a glória, que amais, é desses
que por vós são perseguidos.

Levantai-vos dessas mesas,
saí de vossas molduras,
vede que masmorras negras,
que fortalezas seguras,
que duro peso de algemas,
que profundas sepulturas
nascidas de vossas penas,
de vossas assinaturas.

Considerai no mistério
dos humanos desatinos,
e no polo sempre incerto
dos homens e dos destinos!
Por sentenças, por decretos,
pareceríeis divinos:
e hoje sois, no tempo eterno,
como ilustres assassinos.

Ó soberbos titulares,
tão desdenhosos e altivos!
Por fictícia austeridade,
vãs razões, falsos motivos,
inutilmente matastes:
– vossos mortos são mais vivos;
e, sobre vós, de longe, abrem
grandes olhos pensativos.

domingo, 9 de outubro de 2011

SOBRE O APAGÃO DE 2001 - EPÍSTOLA AOS HOMENS DO FUTURO


SOBRE O APAGÃO DE 2001 - EPÍSTOLA AOS HOMENS DO FUTURO

NEUZA MACHADO

Esta minha Epístola aos Homens do Futuro foi escrita em:

14 DE OUTUBRO DE 2001 - EPÍSTOLA AOS HOMENS DO FUTURO - 4

NEUZA MACHADO

(Para o Brasileiro Consciente do Brasil-País do Futuro lembrar-se sempre que existiu um Brasil-Tristes Trópicos até o final do Século XX)

Caros Amigos do Brasil do Futuro Glorioso, sexta-feira passada ― 12 de Outubro de 2001 ― foi feriado nacional no Brasil Varonil. Comemoramos o dia dedicado à protectora dos brasileses, Nossa Senhora Aparecida, e também o Dia das Crianças. Amanhã será um feriado (15 de Outubro de 2001) para a maior parte da população. Os Comerciários Batalhadores e os Professores Sofressores deste anno de 2001 irão descansar, afastando-se de suas labutas diárias.

Como o feriado em honra da padroeira, neste anno de 2001, caiu em uma sexta-feira, e o outro será comemorado amanhã, uma segunda-feira (lembre-se: estou a escrever esta cartinha para os brasileiros do futuro em um dia de domingo - 14-10-2001), uns poucos “privilegiados” estão, hoje, em casa, de papoproar, “felizes”, “contentes”, ouvindo música, ou assistindo televisão, ou conversando abobrinhas na sala de bater-papo da Máquina Internet (atenção: somente os poucos brasileses que têm Internet nesta anno de 2001). Outros foram viajar (para gastar o pouco dinheiro de seus salários), foram passear com a família, enfrentando o terrível engarrafamento do trânsito, desejosos do ar puro do campo ou do ar puro das regiões banhadas pelo mar. Esses só voltarão para seus lares e o trabalho duro diário amanhã, já no final do dia, enfrentando, novamente, o engarrafamento do trânsito, um problemão sem solução de nossa realidade brasilesa caótica. Outros foram assistir aos filmes estrangeiros (de outros países - com seus heróis poderosos - nos cinemas de suas Cidades; hoje, um domingo, 14 de Outubro de 2001, com certeza, muitos estarão enfrentando filas imensas, pagando caro pelas entradas, gastando o salário recebido, pois não adianta muito economizar), só para se entreterem com as tragédias e as comédias dos povos poderosos do mundo (esquecidos das próprias tragédias cotidianas). Os brasileses, todos oriundos do Final do já Passado Segundo Milênio, adooooooram (e muuuuuuito!) os filmes norte-americanos, principalmente os mais jovens, aqueles filmes norte-americanos replectos de ação e emoção e glorioso poder.

Ainda, em relação ao longo feriado, de 12 de Outubro a 15 de Outubro de 2001 ― quatro dias de folga para a maior parte dos trabalhadores batalhadores ―, quero que saibam o motivo de tal “privilégio”. O Brasil está enfrentando a pior seca de sua história e, submetidos a uma exigência governamental (governo do FHC, Ooooooito Annos Governando o Brasil), os brasileses estão economizando, deeeeeesde o mês de junho!, energia elétrica (não se esqueçam disso aí no Futuro Brasileiro de Vocês!). Neste mês de outubro de 2001, há uma quota de energia disponível para cada residência e os consumidores pobres (ou pobres consumidores) não poderão, em hipótese alguma, extrapolá-la.

Os muuuuuuitos brasileses, muuuuuuito pobres!, estão rezando, e eu também estou rezando muuuuuuito, a Deus Nosso Senhor, todos os dias, pedindo-Lhe que nos envie muuuuuuita chuva. Neste anno de 2001, nós os brasileses conscientes, precisamos de chuva benfazeja para lavar nossas mágoas políticas e nossas almas. As águas dos rios, represadas, sustentam as Grandes Usinas Elétricas do Brasil Varonil. Assim, o longo feriadão deste anno de 2001, segundo fontes governamentais da Capital-Corte de Brasília (são notícias provenientes da Corte), proporcionará uma graaaaaande economia de luz elétrica (para os muuuuuuito ricos, bem entendido!; pois os pobrezinhos brasileirinhos, miudinhos e esfomeadinhos, neste anno de 2001, infelizmente, já vivem no escuro há muito tempo!).

Ainda em relação ao feriadão deste mês de Outubro de 2001, na verdade, o dia dedicado aos Comerciários e Balconistas é o dia 30 de outubro. A data foi antecipada por motivo de economia (os pobres brasileirins economizam para os ricos). Quanto aos professores, se bem me lembro, sempre trabalharam no dia 15 de Outubro. Amanhã, ficarão em casa... trabalhando... quero dizer, corrigindo provas, preparando aulas, aproveitando o tempo disponível para escreverem suas memórias, ou arrumando a casa, ou jogando a metade da papelada, comprada com o suor do próprio rosto ― acumulada em vários anos de trabalho mal remunerado ―, no lixo, et cœtera.

Por falar em professores, estes são os mais desprestigiados deste meu tempo de 2001. Espero que, aí no Futuro Sem-Muro do Brasil Varonil, os pobres sofressores sejam mais prestigiados. Não vou comentar os graus do desprestígio. Se vocês quiserem conhecer as desventuras dos professores brasileses, do Final do Século Vinte e Início do Século Vinte e Um, Anno 2001, façam pesquisas (por favor!), busquem na História (que esta seja idônea), leiam as narrativas ficcionais dos grandes escritores (estes falam verdades que a Imprensa Partidária não ousa publicar), enfim, vasculhem o Passado do Brasil Varonil, e, com toda certeza!, Vocês aí do Futuro Sem-Muro encontrarão os vestígios de tal decadência. Só posso adiantar-lhes que, atualmente, neste anno de 2001, os Bobos da Corte são os Professores. Aí, no Futuro do Brasil Glorioso, Vocês poderão repensar a existência dos chamados Bobos da Corte, desde o aparecimento de tal classe. Pesquisem, meus Amigos, os primórdios da civilização ocidental e os primórdios do Brasil e, só assim, compreenderão o descrédito que atingiu esta classe de sofressores, uma categoria marginalizada que sempre se preocupou em transmitir preciosos conhecimentos adquiridos em longos anos de muita reflexão e leituras diárias.

Enfim, são estas as notícias de meu tempo vital, neste 14 de Outubro de 2001. Espero que aí, no Futuro-Sem-Muro do Brasil Varonil, a vida de Vocês seja mais tranquila (que a terrível dívida ao FMI já esteja liquidada!, se Deus assim o quiser!), com mais dinheiro no próprio bolso (e mais dinheiro no Banco) e fartura de alimentos, sem guerras, sem doenças, et cœtera. Que Deus Nosso Senhor os proteja sempre e os faça felizes. Também, espero que não existam mísseis estrangeiros mortíferos arrasando o Mundo e, de jeito nenhum, bombas atômicas. Espero que as hecatombes desapareçam da face da Terra.

Deste anno de 2001 (já quase no final, graças a Deus!, e eu, aqui, neste passado de vocês, esperando um anno de 2002 replecto de autênticas alegrias), recebam o meu abraço afetuoso, Meus Queridos Homens e Mulheres do Futuro!, e recebam também o meu profundo Amor. O meu Amor chegará até Vocês, acreditem! (ultrapassando as barreiras do tempo!).

ODISSÉIA MARIA, filha de Antônio Aquileu e Jane Briseides, descendentes de imortais e másculos Caçadores de Onças Pintadas e Jaguatiricas Noturnas de Minas Gerais, um mágico território situado na parte Leste do Brasil Varonil.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

EXERCÍCIO CRÍTICO-FENOMENOLÓGICO SOBRE O AMANTE DAS AMAZONAS DE ROGEL SAMUEL


EXERCÍCIO CRÍTICO-FENOMENOLÓGICO SOBRE O AMANTE DAS AMAZONAS DE ROGEL SAMUEL

NEUZA MACHADO

Convido aos meus Leitores-Internautas (e aos estudiosos em geral da literatura brasileira dos anos finais do século XX – literatura esta que eu particularmente computo como Pós-Moderna/Pós-Modernista de Segunda Geração) a lerem o meu exercício crítico-fenomenológico, sobre a obra ficcional O Amante das Amazonas, do escritor amazonense Rogel Samuel, exercício crítico este intitulado O Fogo da Labareda da Serpente.

O meu estudo teórico-crítico-fenomenológico – O Fogo da Labareda da Serpente – poderá ser lido em:



O romance O Amante das Amazonas, para os que desejarem ler esta singularíssima obra do escritor Rogel Samuel (um romance da pós-modernidade que, diga-se de passagem, deverá ser lido em primeiro lugar, para que, posteriormente, o meu estudo crítico-fenomenológico possa tornar possível a compreensão do leitor), se encontra disponibilizado em: http://historiadosamantes.blogspot.com


Um grande abraço aos meus Leitores-Internautas, agradecendo-lhes sempre as suas preciosas visitas e as muitas demonstrações de apreço recebidas através de carinhosos e-mails.


Muito obrigada a todos!