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sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

VII - MÁRIO DE ANDRADE: UM VISIONÁRIO? - PRIMEIRA VERSÃO PRA SER MUSICADA

VII - MÁRIO DE ANDRADE: UM VISIONÁRIO? - PRIMEIRA VERSÃO PRA SER MUSICADA

NEUZA MACHADO

Sobre o tema da desvalorização do café, que afetou a produção brasileira por toda uma década levando à bancarrota vários empresários e, consequentemente, conduzindo à miséria a maior parte do operariado — de 1929 até fins dos anos de 1930 —, Mário de Andrade deixou-nos, como legado, três textos de altíssima grandeza literária: um ficcional, outro dramático/peça teatral, além da versão, em versos, da primeira cena do texto dramático que, segundo a sua sensibilidade, deveria ser musicada. Mário de Andrade foi grande em seu amor pelo Brasil, por seu Estado Natal — São Paulo —, foi imensurável em seu amor e preocupação pelos brasileiros menos afortunados. A melhor apreensão da obra do escritor paulista foi feita pelo crítico literário João Etienne Filho, que a sintetizou com doída sensibilidade na “orelha” da apresentação do livro Poesias Completas, volume 2, das Editoras Martins, de São Paulo, e Itatiaia, de Belo Horizonte (em uma bela parceria para publicação em 1980). São de João Etienne Filho estas palavras:

"Impossível dizer-se tudo sobre o problema da miséria, que Mário de Andrade aborda com impressionante participação; sobre a ternura agri-doce por São Paulo; sobre o modo de falar da carência filial em “Mãe”; sobre aquele final de profunda melancolia do poema sem título, que começa com o verso “São Paulo, pela noite” e termina com “Garoa, sai dos meus olhos”; sobre o poema também sem título, uma espécie de testamento, que termina com o genial jogo de palavras: “Que o espírito será de Deus. / Adeus”. A “Meditação sobre o Tietê”, de pouco menos de três meses antes de sua morte, é inventário, é lembrança, é amor, é solidão, atingindo a fronteira do épico. / Por último, O Café. Será suficiente dizer que esteve proibida sua representação durante os últimos anos? [anos de 1970, época da Ditadura Militar no Brasil] Não que seja provocador, ou agressivo, mas porque simplesmente nos expõe uma realidade nua e crua, da qual os que estão além dos cinquenta se lembram. E isto é feito em forma de ópera-oratório-drama, de beleza e força indescritíveis. / Antes de completar 53 anos ele se foi. Para Deus, como quis, expressamente. Mas ficou para sempre. Na saudade dos amigos, nos debates sobre sua obra, na perenidade que ele nunca procurou, mas que sempre vem para os que a mereceram, pelo dar de si mesmo, pela sensibilidade, pelo amor à vida e a luta pela dignidade humana”.

Depois das palavras de João Etienne Filho, só nos resta continuar o envolvimento teórico-reflexivo com as obras assinaladas, sem afastar-nos de nossa questão central: MÁRIO DE ANDRADE FOI UM VISIONÁRIO? ELE PRENUNCIOU O FUTURO DO BRASIL?

Quanto ao impressionante texto dramatizado, CAFÉ – Tragédia Secular – O POEMA (próprio para ser representado em um palco), deixarei ao encargo dos leitores de meu Blog a busca em outros Sites ou mesmo por meio da compra do livro supracitado de Mário de Andrade.

Animados pela turbulência das cenas anteriores, terminaremos aqui o nosso questionamento lendo A PRIMEIRA VERSÃO A SER MUSICADA. As respostas ou reflexões em relação à questão apresentada virão gradativamente, de acordo com o interesse do Leitor-Internauta.



(PRIMEIRA VERSÃO A SER MUSICADA)

Falai se há dor que se compare à minha!...
Óh gigantes inflexíveis da mina do ouro
Óh anões subterrâneos da servidão
Magnatas com seus poetas laureados, galões e galinhas
Pastéis, pastores, professores, jornalistas e genealogistas
Óh melancias e melaços, burros borras, borrachas, molhos pardavascos,

Óh grandavascos e vendidovascos
O vosso peito ladrilhado com pedrinhas diamantes
É concho e vazio feito a bexiga do Mateus
Monstros tardios sem olhos sem beijo sem mãos
O que fizestes do sentido da vida!
Óh vós gigantes da mina e vós anões subterrâneos
Falai!
O que fizestes, o que fizestes do sentido da vida!...

FRATERNIDADE!...
Onde os irmãos nas avenidas!...

Falai!...
Falai!...

IGUALDADE!...
Onde os irmãos entre os palácios!...

Falai!...
Falai!...

EU SOU AQUELA QUE DISSE:
Raça culpada, a vossa destruição está próxima!
Pois não vedes o sangue dos crepúsculos!
Não vedes o dia novo das auroras!...

Falai!... Falai!... Falai!... Falai!...

(Os policiais estão chanfalhando o povo nas galerias. Levam a Mãe presa.)

(Pano)


SEGUNDA CENA

“O ÊXODO”

(Na estaçãozinha do trem de ferro. Vêm chegando os colonos ao apelo da cidade. Primeiro chegam os moços, estão esperançosos, brincalhões. Contentes de viver na cidade.)



(SEGUNDA VERSÃO PRA SER MUSICADA)

Falai se há dor que se compare à minha!...

Óh gigantes inflexíveis da mina do ouro
Óh anões subterrâneos da servidão
Magnatas com seus poetas laureados, galões e galinhas
Pastéis, pastores, professores, jornalistas e genealogistas
Óh melancias e melaços, burros borras, borrachas, molhos pardavascos,

Óh grandavascos e vendidovascos
O vosso peito ladrilhado com pedrinhas diamantes
É concho e vazio feito a bexiga do Mateus
Monstros tardios sem olhos sem beijo sem mãos
O que fizestes do sentido da vida!
Óh vós gigantes da mina e vós anões subterrâneos
Falai!
O que fizestes, o que fizestes do sentido da vida!...

FRATERNIDADE!... IGUALDADE!...
Onde os irmãos nas avenidas!
Onde os irmãos entre os palácios!

Falai!...
Falai!...

EU SOU AQUELA QUE DISSE:
Raça culpada, a vossa destruição está próxima!
Pois não vedes que o ponteiro está chegando na hora?
Pois não vedes o sangue dos crepúsculos?
Não vedes o dia novo das auroras!...

Falai!... Falai!... Falai!... Falai!...

(Os policiais estão chanfalhando o povo nas galerias. Levam a Mãe presa.)

(Pano)


Aqui se interrompe a Visão de Mário de Andrade, deixando seus leitores-eleitos em suspenso até esta geração... Imbuídos dos novos ares de país em franco desenvolvimento em pleno início de Terceiro Milênio, poderíamos inferir que houve uma revolução socioeconômica em benefício da população de baixa renda, aqui no Brasil, sem derramamento de sangue? Deixo em aberto essa questão para os meus leitores repensarem a atual realidade brasileira. Desejo uma boa leitura para os que me visitam em meus Blogs. Apesar de ainda não existir o hábito do estudo crítico-literário entre a maioria dos Internautas, acredito que posso conquistá-los simplesmente porque temos escritores e poetas geniais como um Machado de Assis, um Mário de Andrade, um Carlos Drummond de Andrade, um João Guimarães Rosa, um João Cabral de Mello Neto e outros — citando somente os Nacionais! Por isso, confiante na qualidade dos textos apresentados e em seus poderes de atração, continuo publicando-os.

Termino com o pensamento de Francis Bacon: “Não há nada tão pernicioso à filosofia como o fato de as coisas familiares e que ocorrem com frequência não atraírem e não prenderem a reflexão dos homens, mas serem admitidas sem exame e investigação das suas causas”.

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