CECÍLIA MEIRELES E SEU “ROMANCEIRO” PÓS-MODERNO: ROMANCE LIII OU DAS PALAVRAS AÉREAS
NEUZA MACHADO
Hoje, neste meu blog, a minha proposta de leitura, para a reflexão dos Leitores-Internautas, é o canto denominado ROMANCE LIII OU DAS PALAVRAS AÉREAS, de Cecília Meireles. Por intermédio da especialíssima criatividade poética de nossa renomada escritora, os Leitores-Eleitos terão a oportunidade de repensar alguns momentos cruciais da História do Brasil.
ROMANCE LIII OU DAS PALAVRAS AÉREAS
Cecília Meireles
Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
Ai, palavras, ai, palavras,
sois de vento, ides no vento,
no vento que não retorna,
e, em tão rápida existência,
tudo se forma e transforma!
Sois de vento, ides no vento,
e quedais, com sorte nova!
Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
Todo o sentido da vida
principia à vossa porta;
o mel do amor cristaliza
seu perfume em vossa rosa;
sois o sonho e sois a audácia,
calúnia, fúria, derrota...
A liberdade das almas,
ai! com letras se elabora...
E dos venenos humanos
sois a mais fina retorta:
frágil, frágil como o vidro
e mais que o aço poderosa!
Reis, impérios, povos, tempos,
pelo vosso impulso rodam...
Detrás de grossas paredes,
de leve, quem vos desfolha?
Pareceis de tênue seda,
sem peso de ação nem de hora...
– e estais no bico das penas,
e estais na tinta que as molha,
e estais nas mãos dos juízes,
e sois o ferro que arrocha,
e sois barco para o exílio,
e sois Moçambique e Angola!
Ai, palavras, ai, palavras,
íeis pela estrada afora,
erguendo asas muito incertas,
entre verdade e galhofa,
desejos do tempo inquieto,
promessas que o mundo sopra...
Ai, palavras, ai, palavras,
mirai-vos: que sois, agora?
– Acusações, sentinelas,
bacamarte, algema, escolta;
– o olho ardente da perfídia,
a velar, na noite morta;
– a umidade dos presídios,
– a solidão pavorosa;
– duro ferro de perguntas,
com sangue em cada resposta;
– e a sentença que caminha,
– e a esperança que não volta,
– e o coração que vacila,
– e o castigo que galopa...
Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
Perdão podíeis ter sido!
– sois madeira que se corta,
– sois vinte degraus de escada,
– sois um pedaço de corda...
– Sois povo pelas janelas,
cortejo, bandeiras, tropa...
Ai, palavras, ai, palavras,
que estranha potência, a vossa!
Éreis um sopro na aragem...
– sois um homem que se enforca!
Quão belas são as palavras dela, da Cecília!
ResponderExcluirParabéns pela postagem!
Obrigada, Eurico!
ResponderExcluirE seja sempre bem-vindo aos meus blogs.
Cecília... Ai ai... Muito bom.
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